Por Émerson Maranhão, colunista Mídia Queer
Um oceano de lindezas a homenagem que Gilberto Gil ganhou de presente de aniversário pelos seus 78 anos completados na última sexta-feira, 26 de junho. Logo cedo, foi disponibilizado no YouTube um vídeo reunindo mais de 50 artistas, muitos de primeira grandeza, cantando “Andar com Fé”.
De Alcione a Chico Buarque, de Marisa Monte a Caetano Veloso, de Zeca Pagodinho a Daniela Mercury, de Regina Casé a Fernanda Montenegro. Sem falar no próprio Gil, e alguns de seus filhos e netos. Além da participação especialíssima de Stevie Wonder, amigo de longa data do homenageado.
O vídeo, captado remotamente e dirigido pelo cineasta Andrucha Waddington, é emocionante! Um verdadeiro bálsamo, um potente raio de luz nestes dias tenebrosos em que vivemos. E, ao falar em trevas, não me refiro somente à pandemia que assola o mundo, como o nobre leitor deve bem imaginar. Caso ainda não o tenha visto, rogo que se permita a estes 4 minutos e 20 segundos de puro deleite.
E se o faço é porque para além da constelação cantante, para além dos versos da canção tão necessários agora, para além da beleza do todo, há o varal de roupas de Fernandinha.
Explico. A atriz e escritora Fernanda Torres, Fernandinha para os habituados a seu entorno (o que não é o caso deste escriba virtual, infelizmente), gravou sua participação num sítio em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, onde sua família passa a quarentena.
Diferente de todos os demais convidados, inclusos aí sua mãe e seu marido, Fernandona e Andrucha, respectivamente, Fernandinha não está na sala de visitas, no escritório, num santuário, numa paisagem esplendorosa, num estúdio caseiro. Ela optou por registrar sua homenagem tendo, ao fundo, um varal de roupas secando ao sol.
Sobre a corda esticada, toalhas, panos de prato, pijamas. Um cenário dos mais comezinhos, e, por isso mesmo, repleto de significados. Ela própria, enquanto canta e dança, sem preocupação aparente, está com os cabelos molhados e desalinhados – recém-saídos de um banho, quem sabe? -, mas não dá a mínima para isso. Transborda alegria e leveza, como se estivesse solta no quintal de casa.
E não é que estava? Tão à vontade que encontra uma brecha na melodia para soltar um animado “É isso aí, Gil!”.
O varal de Fernandinha é libertador! Em meio ao Olimpo, revela a humanidade que nos une e iguala. A nós, do lado de cá, os espectadores quase intrusos, e aos que estão do lá, as tais estrelas. O varal de Fernandinha é, em essência, a anti-revista Caras. E é sensacional por isso.
Sim, há roupa a ser lavada, a ser quarada e seca. Como na minha casa, na sua, em qualquer casa. Sim, os cabelos desalinham quando não forjados pela normatividade de géis, laquês e afins, como o meu, como o seu, como qualquer cabelo.
Sim, é possível fazer do quintal a melhor das pistas de dança. E a área de serviço pode ter muito mais encantos que a sala de visitas. Quem nunca?!
Nestes tempos onde impera a “Cultura da Lacração”, o varal de Fernandinha materializa o seu oposto. E por isso mesmo, lacra verdadeiramente.
Assim como os versos da canção de Gil apontam que a fé está na manhã e no anoitecer, na luz e na escuridão, na cobra coral e num pedaço de pão, o varal de Fernandinha ostenta o quanto a liberdade é transgressora. E ainda evidencia que quanto mais despretensiosa e destituída de ardis, maior é a beleza. Não é à toa que Andrucha escolheu justo essa imagem para abrir o vídeo, depois do prólogo de um certo Francisco Buarque de Holanda.
Por todas as razões, salve Gil, salve Fernandinha. E salve o varal de roupas ao sol!
Assista ao vídeo:
OUÇA ESSA!
“Todos os atores jovens que passam por isso, têm esse receio. Medo de não serem mais escalados ou ficarem estereotipados. Mas acabou acontecendo e meu medo ficou para trás. Acreditamos que nós, jovens gays, lésbicas etc, quando nos assumimos, ajudamos a normalizar essas relações para todo o público. Se algum lugar deixar de me escalar por isso, eu sou capaz de criar meus próprios trabalhos. E saberei que esses lugares não eram para mim”.
Igor Cosso, ator, o Junior de “Salve-se quem puder” (TV Globo), que saiu do armário publicamente no último fim de semana.
MAIS OUTING
Além de Igor, também aproveitaram as celebrações em torno do Dia Mundial do Orgulho LGBT (XYZ) o ator João Côrtes e a cantora Patrícia Marx, que assumiram ser homossexuais, e a atriz Ana Hikari, que se revelou bissexual. Aos quatro, sejam muito bem-vindos ao lado de cá!
VIVA THINA
Todos os salves para Thina Rodrigues, que nos deixou esta semana, vítima da Covid-19. Uma das maiores ativistas da causa trans no estado, Thina era presidente da Associação das Travestis do Ceará (Atrac) e, ultimamente, atuava na Coordenadoria Especial pela Diversidade Sexual de Fortaleza. Uma guerreira, que deixa importante legado de luta para quem fica.
RAINHA SENDO RAINHA
Daniela Mercury brilhou no show online que realizou em homenagem ao Dia do Orgulho LGBT (XYZ). Desde o cenário da live, que simulava um enorme armário de portas abertas (entendedores entenderão), passando pela afirmação e reafirmação de sua família homoafetiva, com a participação da esposa Malu Verçosa e de suas três filhas, até o figurino da abertura do espetáculo, um bandeira do Brasil em formato de manto. “Essa bandeira é de todos os brasileiros. E hoje está na nossa luta do orgulho LGBTQIA+, porque hoje o canto é da DIVERSIDADE”, explicou de frente para a câmera. Rainha, né, mores?
Assista ao show:
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