Podem os subalternos construírem propostas políticas dentro das candidaturas de governo em 2020?

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Bandeira simbolizando as pessoas LGBTs, negras e trans, usadas nos recentes protesto contra violência racista e LGBTfóbica.
Por Silvia Maria Vieira dos Santos, colunista Mídia Queer

Ao ler as matérias dos jornalistas Bruno de Castro (Ceará Criolo) e Rafael Mesquita (Mídia Queer) acerca das candidaturas à prefeitura de Fortaleza e das suas propostas para a população NEGRA e LGBT, respectivamente, me senti provocada a escrever sobre nossa condição de subalternidade.

Não é de se estranhar que apenas 20% das(os) candidatas(os) à capital cearense apresentem propostas concretas para estes grupos e que mesmo candidaturas historicamente associadas ao movimento social tragam este debate de forma superficial em seu plano de governo.

Penso em alguns elementos que coadunam com esta realidade. O primeiro é o fato de estarmos sufocados por um conservadorismo de partidos e grupos de extrema direita que pregam a falácia da família tradicional heteronormativa, do fundamentalismo religioso acima de todos e de práticas universalizantes e violentas que desconsideram a diversidade, entre outros absurdos.

Desse modo, falar de forma universal ou genérica é desvincular a sujeita e o sujeito de seus marcadores étnico-racial, sexual e de gênero, bem como outros que se apresentam em nosso cotidiano. Sabemos que as(os) LGBTs, o povo negro e suas comunidades tradicionais  e as mulheres mais pobres são na maioria das vezes invisibilizados ou considerados caso de polícia para essa necropolítica.

Outro elemento que me provoca é onde estão as experiências das(os) subalternos (aqui uso a categoria de Gaytri Spivak para me referir às populações negras e LBGTs) nas propostas pautadas ou nas citações dos programas de governo? De fato, as(os) subalternas(os) falaram? Ou tiveram comumente porta-vozes?

Concordo com a autora indiana quando diz que as(os) “representantes das(os) subalternas(os)”, ao ouvirem as insurgências destas(es), a escuta a partir do seu tempo, bem como de suas cosmovisões, elaboram entendimentos acerca desses grupos como outro, marginalizado, atrasado, desqualificando e, assim, silenciando a fala e a experiência negra e LGBT.

E nós mulheres? Somos consideradas em nossa pluralidade e pautadas nestas propostas de governo? E como diz Anzaldúa: “nunca tivemos nenhum privilégio”, será que neste pleito as(os) prefeituráveis vão querer nos conhecer e aprender nossa língua? Nós, negras, mães solteiras, LGBT, candomblecistas, umbandistas, indígenas, quilombolas, deficientes, periféricas, profissionais do sexo, encarceradas, faccionadas, estudantes, meninas, jovens, idosas, professoras, artesãs, empregadas domésticas, autônomas, profissionais liberais, entre tantas outras?

Não podemos deixar que nos rotulem e silenciem as intersecções que nos atravessam. As estatísticas de discriminação, opressão e violência que sofrem as(os) negras(os), LGBTs e as mulheres mais pobres são veiculadas todos os dias. Temos que ocupar estes espaços e registrar o que os outros apagam quando falamos, reescrevendo nossas histórias como ato de sobrevivência.

Por isso provoco você a procurar dentro destas propostas a voz das mulheres, das(os), LGBT e da negrada. Em que candidaturas estes movimentos estão protagonizando suas propostas e construindo de fato outra gramática a partir de suas referências e não daquelas que nos foram impostas como verdadeiras, de uma história única possível?

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